A Massa (2008-09)
...Cereais,
cereais... Vejo ao longe a grande massa popular, a turba enraivecida em busca
de respostas, de ações... Eles querem comer, querem que seus filhos, suas
mulheres e seus idosos se alimentem dignamente!... Eles se aproximam... ouço o
rufar dos tambores, o ranger dos dentes, o gritar, o urrar, o cantar em tom
forte e agressivo, o marchar... Enfim, o povo está chegando!
E
vem armado de foices, enxadas, martelos e batatas...
Ele
quer as cabeças de nossos líderes corruptos... e as quer já... sem mais demora,
sem mais esperar... É o fim? Não, é só o começo!
O Grande Golpe
“Como pode ser?” É o povo
quem pergunta.
Os corruptos dominaram o nosso reino, eles estão entre
nós!
Vivemos em um período de caça às bruxas... não sabemos
mais em quem confiar... a quem seguir... todos são suspeitos... está tudo uma
desordem...
A começar pelo fato de um fumacê, entenda-se Tacitus, ser
nomeado secretário da Fazenda... não o deixem muito tempo com as verdinhas!
E, para piorar a situação, o próprio Tribunal de Muitos
Ofícios, fiel seguidor e defensor de Continellius, declarou estado de sítio e
mudança de governo!
Querem transformar nosso MA7 em uma “república laica”!
Contudo, não! Nós não queremos isso! Nem aceitaremos essa
política de provisórias! Só pode ser mais um complô, uma nova tentativa de
ampliar o poder de Continellius!
Eis a explicação: o Tribunal de Muitos Ofícios, em nome
do príncipe, contratou Él Sparrow e seus piratas para seqüestrarem Geraldo I, o
ausente – foi um plano esperto, visto que demoraríamos a sentir sua falta,
devido à acostumação à sua ausência – e, em troca, a Igreja compraria todo o
estoque de rum bucaneiro – desta forma, a mercadoria contrabandeada seria
legalizada e suas faltas apagadas, ponto positivo para Él -, mas qual seria o
destino deste rum? O que faria a Santa Sé com toda aquela bebida? A resposta é
simples, meus camaradas, política do Pão e Circo (Rum e Carnaval): distribuir
rum às massas para ganhar seus votos, seu apoio, sua devoção e etc..
E mais... não contente em apenas negociar com corsários,
o Santo Tribunal violou a mais sagrada das normas reais, contatar os fumacês,
pagando a Paulus Tacitus para, por meio de uma denúncia combinada, agitar o
povo a uma revolta.
Sabendo da nossa necessidade de armas para uma vitoriosa
revolução, tinha certeza, o Tribunal, de que pediríamos ajuda aos piratas; e
estes, por sua vez, já sabendo e participando dos planos maquiavélicos de
Continellius, nos apoiariam até o momento em que decidíssemos invadir o palácio
e hastear a bandeira corsária.
Enfim, em meio a todo esse caos, onde as lideranças
teoricamente estariam confusas e perdidas, seria fácil declarar uma mudança de
governo, mudança esta que teria por seu fim último o restabelecimento da paz e
prosperidade de MA7.
Confesso, só percebemos esta traição quando muitos de nossos companheiros começaram a ser mortos à beira-mar, mortos por bombardeios de Él Sparrow – ó sábio pirata, não deixe que a ganância turca controle sua vida!
O povo aconselha ao Santo tribunal a desistir de tentar comprá-lo oferecendo cargos públicos: somos uma monarquia, e Geraldo I é o nosso rei!
Feios, Sujos e Malvados
(Mas não tão malvados quanto o príncipe).
A
Massa – Um novo jornal
Antes de qualquer coisa, gostaria de
apresentar o nosso (da massa) novo jornal. Ele é composto pelos membros da
antiga plebe MA7 - do tempo em que éramos uma monarquia; do tempo em que o
Ausente era nosso rei.
O campesinato, por
meio de uma reestruturação, organizou-se em um partido: "Não
queremos mais ser chamados de camponeses, e sim de proletários (...) estamos
agora unidos e temos o apoio dos Sovietes... É a Revolução Mundial!”,
é o que podemos ouvir durante os comícios...
Enfim, é este partido - Partido dos Feios,
Sujos e Malvados, vulgo PFSM -
que controla o jornal A Massa.
Como um primeiro
manifesto, neste novo jornal, queremos botar em discussão a acusação
feita pelo Tribunal de Muitos Ofícios à pessoa do nosso fiel
presidente, o ex-príncipe Continellius.
Eis
o que pensamos, ou melhor, eis o que eu e os outros membros da
presidência do partido pensamos - os contrários às nossas decisões e opiniões
foram, de uma forma definitiva, excluídos, apagados, calados, mortos
como ratos, como traidores da causa... -, voltemos ao manifesto:
Falam mal de nosso líder? Será que é pelo fato de ele ter sido o primeiro a nos defender? O primeiro a estar ao nosso lado nos momentos de crise? Ou será pelo fato de ter sido ele o "criador" do nosso partido?
Deve ele, por esta razão, ser chamado de comunista? Quando os "Renatões" pensaram - um minuto sequer - no povo, nos simples cidadãos de MA7? A resposta é nunca! Nunca nos permitiram a participação nas questões políticas... nunca criaram leis a nosso favor... nunca fomos tão bem controlados quanto hoje...
Deixamos, pois, de ser uma massa descontrolada de
camponeses famintos e enraivecidos, e tornamo-nos "organizados"
manifestantes. Fomos normatizados (normalizados); nossas reivindicações agora
são feitas por meio do partido. Já não existem mais as grandes marchas armadas
de foices, enxadas, batatas e etc. Estas não são mais permitidas, do contrário,
perderíamos o apoio dos Sovietes.
Vejam quantas maravilhas! Será
mesmo Continellius um populista?
Marmiteiros, mãos à obra! Não deixemos que
estes radicais tomem o poder, que se dane a Direita Rebolativa -- a não ser que
ela rebole tão bem quanto a Josephine Baker -, e as suas revoluções ou
contra-revoluções baratas: a verdadeira revolução é a proletária, a nossa,
enfim! Já o dizia Marx.
Queremos a permanência do presidente e do
regime!
Obrigado.
Feios, Sujos e "Menos-Malvados" (agora organizados em um partido).
A Massa - Quarta Edição - Segunda Impressão, corrigida
É uma maravilha! São os cidadãos de MA7 que se
revoltam! Revoltam-se contra o Clero (contra o Tribunal dos Muitos Ofícios)
e contra o Matheus! E o Renaton, onde está?
Não é sem
tempo, até que em fim o povo percebeu que de nada valem essas lideranças
burguesas. Barricadas estão sendo levantadas em frente ao Santo Tribunal. Vejam
vocês, é a revolução! O socialismo é o fim esperado!
Em resposta a Giuliana: não somos uma "massa
de fúteis", somos o povo e merecemos o nosso respeito! Não apoiamos o
Clero, e sim o Ex-Rei, o Ex-Ausente, Geraldo I, o monarca que só
aparece na hora da confusão.
Apoiaremos motins, greves e outras formas de manifestação,
com todo o prazer!
Em meio a toda esta confusão:
- Onde se encontra a Pirataria. Estariam os
nobres bucaneiros de rum embriagados? Ou aproveitando
a hora do café?
- E o nosso ditador? Onde está Continellius?
Alguém sabe? Qual é mesmo o valor da recompensa por sua captura?
- Desejamos voltar a ser uma monarquia, só que,
desta vez, laica.
- Uma crítica ao Santo Tribunal: como podem estes santos pecadores vender um
gabarito roubado? Ou melhor, como podem estes santos pecadores roubar um
gabarito?
- Uma critica a Maíra, ela não apóia a
revolução, e sim tenta estabelecer uma política de conciliação.
Obs.: Nós, membros do PFSM,
estamos dispostos a receber todos os que se dispuserem a seguir em frente com a
revolução, pois, mesmo perdida a primeira batalha, visto que a prova
realmente ocorreu, não devemos, e nem podemos desistir! Haverá outra,
outras...
Enfim, as inscrições estão abertas. E, além
do cartão de "Membros Associados" do PFSM, os recém-admitidos receberão um broche, camisetas
e bandeirinhas colecionáveis com as cores do Partido.
Obrigado. Fim à moralidade e viva aos revolucionários!
Feios, Sujos e Malvados.
A Massa - Quinta Edição - Esta não passou pelo
"visto do diretor geral"
Ultraje! "jornaleco massificado”, eis do que somos chamados! É uma total falta
de respeito! Onde está a liberdade de
imprensa? Onde está a ética política? Onde está o governo laico? Onde
está o que não está ou devia estar?
Não aceitaremos mais essas políticas conciliadoras
(ou cautelosas), nem a interferência do Santo Tribunal em
assuntos políticos.
E, quanto às visitas diplomáticas de Continellius,
só pode ser mais uma tentativa de contra-golpe. Bem conveniente sumirem ao
mesmo tempo piratas e ditador...
Quanto à Somália, deve ser apenas mais um boato,
espalhado pela Direita-Rebolativa-Baker, para desviar a nossa atenção.
Sentimos falta do tempo em que éramos "simples"
camponeses, pois, quando queríamos algo, o fazíamos sem toda essa
burocracia inútil. Podíamos manifestar nossas opiniões e desejos
"livremente", sem a intervenção de um partido ou sindicato.
Proletários?! Rá, somos apenas indivíduos
controlados, manipulados, normalizados que pensam poder mudar alguma coisa.
Rá, o Partido?! Este retirou a nossa capacidade de
pensar - não a capacidade de pensar em si, mas fez de sua vontade (a do
Partido) a nossa.
At.,
Feios, Sujos e Malvados, agora desolados.
A Massa
- Derradeira Edição!
Jornal posto na ilegalidade! Partido dos Feios, Sujos e Malvados (PFSM) desativado.
Notícias Urgentes:
Desolados, redatores, editores, diretores, ilustradores,
comentaristas, impressores e demais funcionários de A Massa saltam janela a fora; mas tudo
é vão, visto que a sede do jornal fica em uma casa térrea: o máximo que
conseguem é uma pancada no nariz; mesmo assim, saltam, uns após os outros...
Já a “equipe de base" (faxineiros
(as), cozinheiros (as) e entregadores (as) e etc.) não deu o braço a
torcer: armou-se como pôde e marcha rumo a um destino incerto; planeja
enfrentar as forças reais de Geraldo I, o retornado, assim como tudo o que
contra ela vier.
Outras Notícias:
A desconhecida moça que andava pela
praia desapareceu! "Atirou-se à primeira onda e foi engolida pelo
mar", soprou o vento.
É uma pena... podemos imaginar seu
lindo sorriso tomando uma expressão de falta de ar; bem como seus olhos
perdendo o brilho, tornando-se opacos, à medida em que afundava...
Soprar informações e engolir!
Demasiado humano e pouco natural...
Alguns de nossos leitores podem estar
pensando: "nossa, como as matérias desse jornal apresentam lacunas, furos!";
não, não são traças... É apenas mais um exemplo do sentimento de superioridade
do Ser Humano, pois coloca ações puramente humanas, ou animais (soprar e
engolir) em coisas não-animais como o vento e o mar...
Mas
ainda conseguiremos entender o vento e o mar em si mesmo (s), sem
personificações!
Voltemos às notícias...
O que aconteceu com o estranho sujeito
que tentava transpor a janela? Ora, arrependeu-se, voltou e fechou as janelas.
Do lado de dentro, abraçou apaixonadamente os girassóis que havia colhido, mas
quando viu, caiu em si, nada tinha nos braços: colhera um sonho, uma hipótese,
um vir a ser que não foi e nem será.
Por fim, deitou-se no chão e começou a
ressignificar sua vida.
A Despedida:
Eis que, em meio à fragmentação
de MA-Quase-Lá, o jornal A
Massa se despede, ou melhor, eu me despeço, visto que, como já
disse, os outros funcionários deste periódico já se foram.
Agora, o que farei? Suicidar-me-ei, como alguns? Lançar-me-ei a uma causa perdida, como outros? Não, nem um e nem outro! Eu pegarei a escada que ali está -- esqueci, vocês não podem ver a escada; na verdade, nem eu a posso ver, contudo, imaginemos uma escada recostada no muro atrás da sede --, subirei no telhado, abrirei meu guarda-chuva e pagarei carona com a (na) primeira rajada de vento que vier. Adeus!
Abraço
e até mais...
‘A Massa’ foi uma brincadeira feita por mim no e-mail da classe do curso de Bacharelado e Licenciatura em História, na PUC-SP, no período de 2008-09.