O Riso (2012)
Estavam
todos em silêncio esperando o início da apresentação quando, de repente, o riso
tomou conta da sala. Ninguém entendia nada, mas todos riam.
O
riso contagiou os espectadores de tal forma que demorou a se perceber que se
tratava de uma apresentação. Alguns até pensavam (e eu estou nesse grupo!) que
aquela era a performance: o riso. Porém, não era. A performance que todos
aguardavam veio depois.
A performance que o programa
anunciara e que todos esperavam era a untitled
(moving image), do artista francês Julien Bismuth. Uma performance onde o
artista, valendo-se de uma folha de papel sulfite e um projetor, projetava, na
folha que segurava, uma imagem conhecida da Cidade de São Paulo, ao mesmo tempo
em que falava sobre a imagem e as suas noções de representação. Não era, então,
uma simples projeção de imagem, mas a discussão da própria imagem.
Julien Bismuth nasceu em Paris (1973),
trabalhou e morou em Nova York e, atualmente, mora no Rio de Janeiro. Em seu
Currículo estão exposições em diversos museus e galerias ao redor do mundo,
entre estes: Emanuel Layr Galeria,
Viena, The Box, Los Angeles, Galeria Georges-Philippe & Nathalie
Vallois, Paris. Julien Bismuth foi o idealizador da performance do riso.
Foram três artistas (duas garotas e um rapaz),
misturados entre o público, que começaram o riso que se espalhou. Foi tudo tão
discreto, tão natural que, no começo, não parecia uma performance. O programa
da mostra, propositalmente, não citava esta performance.
Mas por que mantê-la em segredo?
Ora, porque o riso só funciona quando nos pega de surpresa. O cômico vem do
inesperado. Diz Henri Bergson em seu livro O
Riso (Le Rire): “um homem, que
corria pela rua, tropeça e cai: os passantes riem. A gente não riria dele, eu
penso (...). A gente ri do fato dele ter se sentado involuntariamente. Não é,
portanto, a sua mudança brusca de atitude que faz rir, é o que há de
involuntário na mudança, é a falta de jeito.” Aí está, não havia nada de
engraçado, nenhum motivo para se rir, mas a mudança de atitude, de uma postura
séria e curiosa que aguarda o início de uma apresentação, para um riso despreocupado,
contaminou a todos. O ambiente ficou até mais leve, descontraído para receber a
apresentação programada.
Esta
performance a qual chamo de “riso”, pois não possui título, foi ao mesmo tempo
simples e complexa. Simples, pelo fato do riso ser uma ação comum no dia-a-dia
humano e por não se utilizar de nada além da própria voz dos artistas, e também
por não apresentar os artistas (uma performance, geralmente, é a própria
exposição do artista). E complexa, porque discute metodologicamente a própria performance,
o que era o objetivo da mostra VERBO 2012,
apresentada pela Galeria Vermelho no dia 02 de Outubro. A mostra VERBO está em
sua oitava edição, sempre promovendo a performance nacional e internacional.
A performance, surgida nas décadas
de 1960 e 1970, transformou o cenário artístico mundial. Primeiro, por utilizar
o próprio corpo do artista como objeto artístico. Segundo, por pretender ser
algo que fosse além da mera contemplação, algo que provocasse, chocasse, que se
relacionasse diretamente com os espectadores. Neste primeiro momento, não
existiam roteiros ou ensaios, o real era buscado. E, para ser real, a
performance deveria ser feita uma vez (no momento) e nunca mais. Se fosse
refeita, seria uma apresentação e, desta forma, deixaria de ser novidade tanto
para o público quanto para o próprio artista, que estava sempre em busca de
algo novo. Acreditava-se que a performance refeita acabaria se tornando mera
repetição, reencenação, como ocorre numa peça de teatro: algo falso que não
desperta interesse. A performance, junto a instalação, foi o ponto de partida
para a Arte Contemporânea.
De um tempo para cá, isso mudou.
Hoje, as performances são apresentadas e reapresentadas continuamente, pelos
próprios artistas criadores ou por outros. Ainda existe a noção de arte
momentânea, que não visa a preservação, porém, podem se repetir ou reinventar,
tudo depende do ponto de vista do artista.
Essa é, certamente, outra
característica importante do riso, porque seus artistas não procuraram chocar
nem provocar qualquer reflexão, como no começo das performances, entretanto,
também não encenaram, como fazem artistas mais recentes, foi algo totalmente
natural que levou todos os espectadores a participar. É característico da Arte
Contemporânea estabelecer relações entre autor, obra e público.